No meio académico de Lisboa e Porto, teve lugar, em 1931, um movimento grevista, iniciado na capital com a prisão do estudante da Faculdade de Ciências, Francisco Joaquim Mendes, presidente da Federação Académica. Após a declaração de greve às aulas em diversas faculdades, entre as quais na de Medicina e Letras, para 25 de Abril, realizou-se no mesmo dia uma manifestação de protesto contra essa detenção que terminou com um assalto ao ministério da Instrução Pública. Os estudantes conseguiram a libertação do seu dirigente associativo e este, acompanhado dos colegas, entre os quais se contavam Teófilo Carvalho dos Santos, Artur Santos Silva e José Magalhães Godinho dirigiram-se ao ministro. Após a declaração de greve às aulas em diversas faculdades, entre as quais na de Medicina e Letras de Lisboa, para 25 de Abril, realizou-se no mesmo dia uma manifestação de protesto contra essa detenção que terminou com um assalto ao ministério da Instrução Pública.
Após saberem da agitação estudantil em Lisboa, sucederam-se, no Porto, manifestações no Instituto Industrial e no Instituto Superior de Comércio, e, em 28 de Abril, realizou-se, na Faculdade de Medicina dessa cidade, uma assembleia-geral de alunos presidida Tal como em Lisboa, a PSP invadiu essa faculdade, prendendo Luís Camossa, Gomes de Almeida e António Barros Machado, posteriormente enviados em regime de residência fixa para Famalicão e Paredes de Coura. Foi a prisão deste último, estudante de Ciências e vogal da associação académica presidida por Emídio Guerreiro, que, ao ser enviado para o Aljube, radicalizou o movimento estudantil, no Porto, onde a sua libertação acabou por ser conseguida, devido às ameaças de greve geral feitas junto do reitor da Universidade, Alexandre de Sousa Pinto.
A carga policial da PSP na Faculdade de Medicina provocou, no entanto, também três feridos graves, um dos quais acabaria por falecer. Tratou-se de João Martins Branco, estudante do Instituto Industrial, cujo funeral, realizado em 30 de Abril, no Porto, se transformou numa grande manifestação contra a ditadura, da qual viria a resultar o ferimento a tiro de de 17 pessoas, pela polícia. Nesse mesmo dia, em Coimbra, os estudantes Mário Cal Brandão e Fernando Correia Simões, elementos de ligação com o coronel reviralhista Hélder Ribeiro, que estava clandestino naquela cidade, e Camilo Cortesão, no Porto, foram informados por este último de que iria eclodir um movimento revolucionário, no dia 2 de Maio. Este acabaria por não sair, devido à forte prevenção das unidades militares instaurada pelo governo e à detenção, em Coimbra, de diversos estudantes de Coimbra, enviados depois em regime de residência fixa para fora dessas cidades.
Entretanto o 1.º de Maio de 1931 foi celebrado, em Lisboa, com tiroteio e bombas, em Lisboa, em particular nas ruas da Baixa, no Bairro Alto e na Mouraria, onde houve confrontos violentos entre jovens nacionalistas e direitistas, por um lado, e estudantes comunistas, por outro lado, que se saldaram em quatro mortos e cerca de vinte feridos. «No Rossio, Largo de São Domingos, Ruas de Santa Justa e dos Fanqueiros, Praça da Figueira e noutros locais os manifestantes enfrentaram a polícia e a Guarda Republicana», conforme descreveu Pedro da Rocha que, nesse dia, aprendeu a atirar bombas, com o seu camarada da FJCP, Fernando Quirino. Houve ainda uma manifestação ruidosa frente ao edifício do Aljube e à Casa de Reclusão Militar, com o objectivo de obter a libertação dos presos políticos que ali se encontravam. Curiosamente a Censura deixou passar, potenciando os relatos catastróficos dessa jornada, em que morreram quatro manifestantes. Houve ainda manifestações em Braga, Viana do Castelo, no Cartaxo, em Óbidos, Almada, Tortosendo e Faro. O PCP e a FJCP, que entretanto criara brigadas de auto-defesa para lidar tanto com os nacionalistas como com a repressão policial, voltaram a convocar manifestações em Lisboa e no Porto, para o dia 8, que terminaram novamente em confrontos com a polícia e a GNR, bem como com apoiantes da UN e da Liga 28 de Maio
Após Salazar, ainda ministro das Finanças, mas já com uma postura de chefe do Ministério, emitir uma nota oficiosa a alertar contra os prejuízos para o erário público, provocados pela agitação e os actos revolucionários, avisando que o governo os tornaria «impotentes para a acção revolucionária». Para dia 17 de Maio, o chefe do governo Domingos de Oliveira e Salazar, com o apoio da recém-criada UN, promoveram uma manifestação de massas de auto-apoio, que terminaria com um comício no Coliseu dos Recreios, à Rua das Portas de Santo Antão, onde Oliveira Salaza foi o mais aplaudido. Após aplaudir o ministro das Finanças, a multidão dispersou. No entanto, era esperada nas ruas circunvizinhas por manifestantes «contrários», havendo correrias, distúrbios e explosões de alguns petardos, não só na Rua das Portas de Santo Antão, como no Rossio, na Av. da Liberdade e no Chiado, onde foi lançada outra bomba. O mesmo voltaria a acontecer no dia seguinte, 18 de Maio, ao explodirem petardos junto dos estudantes «nacionalistas» concentrados na estação de caminhos-de-ferro do Rossio, onde aguardavam transporte para regressarem às suas terras. Durante a noite, voltaram a ser lançadas bombas sobre o monumento aos Restauradores, enquanto a PI realizava rusgas e prisões nas hostes “esquerdistas”. Foram presos diversos jovens, acusados do lançamento dos petardos nos dias anteriores no centro de Lisboa, bem como do alto do elevador de Santa Justa, alguns dos quais foram depois deportados para Timor.
No seio do governo, havia entretanto chegado a hora de fazer o balanço da situação e de revelar unidade. Política e militarmente vitoriosa das revoltas das ilhas e de algumas colónias, a Ditadura Nacional voltou a endurecer os seus meios repressivos.Além de demitir a maioria dos 300 implicados presos, deportou-os à «ordem do Governo», sem qualquer julgamento, para novas colónias penais entretanto criadas, nomeadamente em Ataúro e Oecussi, em Timor, bem como na ilha de S. Nicolau, no arquipélago de Cabo Verde. Aqui, foi aberto, no Verão de 1931, nas antigas instalações do seminário da vila da Ribeira Brava, um campo penal, para onde foram enviados cerca de 160 presos republicanos, instalados em deploráveis condições de deportação. Muitos ficariam na deportação por mais de dois anos e alguns nem sequer foram abrangidos pela amnistia de 1932, como aconteceu ao general Silva Dias, que viria a morrer em Cabo Verde em 27 de Abril de 1934.
De qualquer forma, devido às inúmeras críticas a Polícia de Informações (PI), devido aos seus violentos desmandos, esta acabaria por ser dissolvida, sendo as suas funções transitoriamente entregues à PSP. Em 28 de Julho, reapareceu, ,em larga medida devido à implantação da República em Espanha, que levou à necessidade de reforçar as fronteiras, a Polícia Internacional Portuguesa (PIP), que tinha sido criada em 1928, mas extinta em 1930. Ao voltar a ser estruturada, em Julho de 1931, enquanto polícia de estrangeiros, de combate à espionagem e de repressão do comunismo (entendido como uma quinta coluna estrangeira), a PIP passou a ser tutelada pelo ministério do Interior, que nomeou o capitão do Exército, Agostinho Lourenço, para a respectiva chefia. Este viria a ser o director da PVDE e da PIDE, até aos anos 50 do século XX..
Depois das grandes revoltas do primeiro semestre de 1931, foi também simplificado o processo de instrução do Tribunal Militar Especial e reforçada a censura prévia. Após as revoltas das Ilhas, uma circular de 7 de Junho, em nome do director-geral interino da Censura, major Salvação Barreto, lembrou aos oficiais censores das delegações que o seu papel na «preparação do Estado Novo» requeria «especial vigilância sobre aqueles jornais» que interpretassem «esta tendência como propósito de regresso aos antigos processos».
Depois de muitos encontros clandestinos em Portugal e no exílio francês e espanhol, acabaria por irromper nova tentativa civil e militar de derrube do regime ditatorial, de forma intempestiva e prematura, em 26 de Agosto de 1931, sem que estivessem estabelecidas todas as ligações no interior do País. Além disso, a eclosão da revolta interferiu com o envolvimento na campanha eleitoral autárquica, possibilitada em Junho desse ano de 1931, pelo governo, da recém-formada Aliança Republicana-Socialista (ARS). Esta era uma frente sob a liderança do general Norton de Matos, que integrou vários partidos republicanos e socialistas, bem como diversas personalidades adversárias da Ditadura Nacional, erguida em 1926.
Ao mesmo tempo que o movimento revolucionário que eclodiria em Agosto estava a ser preparado, os jovens comunistas da FJCP montavam «brigadas de autodefesa» para a realização de uma Jornada Internacional da Juventude, também programada para Agosto. No entanto, devido à eclosão precipitada da revolta republicana de dia 26 desse mês, os jovens comunistas viram-se obrigados a anular a jornada. Alguns deles envolveram-se nos preparativos da revolta reviralhista, embora se criticasse no interior do PCP essa intervenção. Em 24 de Agosto, realizou-se uma reunião do Secretariado do PCP, onde se manifestaram diversas posições sobre a estratégia a seguir relativamente à sublevação programada, onde «Raul Marques» (José de Sousa) manifestou a opinião de que os comunistas não deveriam participar nela.
Quanto ao movimento revolucionário propriamente dito, após uma última reunião do Comité Revolucionário, na madrugada de 26 de Agosto, realizada no 2.º andar do n.º 17 de um prédio na Rua D. Estefânia, o coronel António Augusto Dias Antunes, o tenente-coronel José Sarmento de Beires, o capitão Jaime Baptista e dois oficiais da Armada seguiram de automóvel para a Avenida João Crisóstomo. Era ali que residia o coronel de Infantaria Hélder dos Santos Ribeiro, coordenador do movimento. A jornada de 26 de Agosto foi um fracasso total dos sublevados civis e militares nela envolvidos. Com a excepção de Lisboa, o resto do país pareceu estar alheado dos acontecimentos da capital, apesar de tentativas para secundar o movimento, por exemplo no Porto, mas sem resultados práticos. Controlando totalmente a situação, o governo nem tinha recorrido aos 800 homens e carros blindados de Mafra, que aguardavam estacionados em Belas.
No dia 27 de Agosto de 1931, o ministro do Interior e da Guerra, Lopes Mateus, realizou, no Quartel do Carmo, uma conferência de imprensa a condenar o «criminoso» golpe perpetrado pelos «políticos», sublinhando que o Exército respondera com «a maior nobreza e decisão aos desordeiros». A revolta de Agosto de 1931 viria a trazer grandes consequências a nível do governo e da oposição à Ditadura. Ao mesmo tempo que a ditadura reforçava a sua força política, terminava definitivamente o diálogo no seio dela com os velhos partidos republicanos. Por seu turno, Salazar via a sua posição claramente reforçada, começando-se a falar abertamente da sua nomeação para a chefia do governo. Depois de, no último dia de Agosto, a Censura ter proibido qualquer referência na imprensa à ARS, esta foi extinta e o seu secretário, José António Simões Raposo Jr. (1875-1948), participante na revolta de 26 de Agosto, preso e deportado para Timor. Terminava dessa forma também a possibilidade de luta legal contra a Ditadura, que aproveitou para reforçar reactivar a PIP, em 21 de Julho, e voltar a expurgar os seus adversários políticos, afastando do serviço todos os funcionários públicos, civis e militares, suspeitos de atitude hostil à «Situação».
Se todas as revoltas do ano de 1931 resultaram em mais de 200 mortos e cerca de mil feridos, só o movimento revolucionário de 26 de Agosto saldou-se pela morte de 40 pessoas e pelo ferimento de 200 a 300 civis e militares. Os locais onde houve mais baixas foram aqueles em torno do Parque Eduardo VII, o Largo do Rato e arredores, bem como os bairros do Castelo e de Alfama, em Lisboa. Segundo a imprensa, ocorreu um «morticínio», nas ruas em redor do forte de Almada, onde foram feridos muitos civis e mortos 4 adultos e 4 crianças, através do bombardeamento, por engano, de um avião vindo de Alverca, pilotado pelo aviador civil sublevado, Manuel Vasques, e pelo sargento José Carvalho. Todas as revoltas e manifestações populares do ano de 1931 resultaram também em milhares de detenções e cerca de 1.500 deportações para as ilhas e as colónias.
Na sequência do 26 de Agosto, houve mais de sete centenas de presos, que foram encarcerados, entre outras, nos presídios de S. Julião da Barra, Peniche e Elvas, bem como na Penitenciária de Lisboa, que ficou repleta. Mais de três centenas e meia de civis, muitos deles comunistas, anarquistas e socialistas embarcariam, sem qualquer julgamento, para a deportação em Timor, Cabo Verde, Angola e São Tomé. Os que não foram detidos em 1931, foram afastados das Forças Armadas e da administração pública, ou colocados em residência fixa na metrópole, enquanto muitos outros “escolhiam” o caminho do exílio. O TME, recriado em 19 de Dezembro do ano anterior, mas extinto no início de 1931, voltou, após o mês de Agosto, a funcionar em Lisboa, acumulando funções de instrução e de julgamento. À medida que Salazar e os seus apoiantes tão bem usavam o aparelho de propaganda, a Censura era a outra arma que acompanhava aquele instrumento.
O poder político explorava o cansaço que se fazia sentir face à intranquilidade pública e culpaava os revoltosos de contribuírem para o aumento da crise económica e financeira, já de si grave. Por outro lado, controlava a “opinião pública”, ao dominar a imprensa adversa através da censura e ao utilizar os seus próprios jornais para potenciar os perigos da desordem económica, social e política urbana, usada esta como espantalho. Foi assim formando uma “opinião pública” que aspirava à «ordem», à «autoridade» e à «tranquilidade» e deixava de se interessar pelos que, de forma minoritária, resistiam a uma Ditadura que se eternizava. Tanto mais que essa “opinião pública” não tinha qualquer saudade do período que havia antecedido o golpe de 28 de Maio de 1926. Por isso, não só a ditadura militar estava em óptimas condições para defender a limitação e mesmo o fim das liberdades públicas, como sabia ter chegado o momento para reerguer ou reforçar instituições repressivas.
O que aconteceu entretanto pelas bandas dos anarquistas, dos libertários e comunistas? Cada vez mais virados para o trabalho sindical, os comunistas actuavam na CIS, enquanto os anarquistas e libertários, tinham a CGT, os socialistas agiam na Federação das Associações Operárias (FAO), havendo ainda os que se organizam n os Sindicatos Autónomos.
Comunistas e anarquistas continuaram a confrontar-se e a rivalizar, respectivamente através da CIS e da CGT, no terreno sindical, mas este já estava num movimento de refluxo e defensivo, apesar de algumas eclosões pontuais de agitação laboral. As duas centrais sindicais tinham uma estratégia e tácticas diferentes. Enquanto a CGT lutava pelo «Trabalho para Todos», pela diminuição da jornada de trabalho para seis horas e por um salário mínimo que acompanhasse o custo de vida, sem distinção de sexo ou profissão, a CIS tinha como lema «Pão e Trabalho», admitindo a jornada laboral de oito horas e lutando por um subsídio de desemprego.
As diversas tendências do movimento operário e sindical estavam todas de acordo na recusa da proposta governamental de um desconto de 2% sobre os salários dos trabalhadores, enquanto os patrões apenas pagariam 1%, para o financiamento da Caixa de Auxílio. Por isso, tanto a CIS como a CGT se uniram em manifestações e na convocação conjunta de greves, em Junho de 1931, para impedir a entrada vigor do decreto que previa esses descontos. Sentindo dificuldade em actuar na clandestinidade, devido à sua cultura libertária, a CGT viria a perder a sua hegemonia no movimento sindical, a favor de uma CIS mais pragmática, dirigida por um PCP em moldes leninistas. Embora ainda com um número reduzido de militantes, mas num período em que podia contar com o relacionamento com a URSS, a partir do final de 1931, o PCP começou nesse ano a publicar o Avante! e O Jovem, influenciando um número cada vez maior de jovens, organizados na FJCP.
Em 27 de Maio de 1932, foram publicados os estatutos da UN e, na sessão em que tomaram posse os seus respectivos corpos directivos, Salazar proferiu um discurso, intitulado «As Diferentes Forças Políticas em Face da Revolução Nacional».O ministro das Finanças não só apelou aos monárquicos para que não ficassem «presos a cadáveres», numa provável referência à recente morte de D. Manuel II, como se dirigiu também aos católicos, pedindo-lhes que apenas se empenhassem nas questões sociais e deixassem de actuar politicamente através do CCP, que deveria ser dissolvido. Quanto aos «antigos partidos», a bem da ordem e da legitimidade da Ditadura, deveriam ser «reduzidos pelo Exército à impotência». Depois de considerar que «o processo da democracia parlamentar» - regime de «facções» - estava ferido de morte, afirmou a urgência de erguer um Estado forte, defensor da «ordem». Finalmente, Salazar condenou os socialistas, anarquistas e comunistas, que defendiam uma sociedade «sem pátria, sem família, sem propriedade e sem moral», dizendo que nada havia «de mais oposto às tendências da Ditadura e aos princípios do Estado Novo».
No dia seguinte, em 28 de Maio de 1932, em que se comemoravam seis anos sobre o golpe militar, Carmona atribuiu, ao ministro das Finanças, na antiga Sala do Conselho do Ministério do Interior, a Grã-Cruz da Torre e Espada, até então apenas outorgada, no caso dos civis, a chefes do governo. O ministro das Finanças dirigir-se ao Exército, dizendo-lhe que este não tinha que «fazer política», mas deveria ser «até ao fim a garantia e o penhor da revolução nacional», sendo veementemente aplaudido pelos oficiais presentes. Entre os adeptos da situação e os militares, era geral o sentimento de que havia que substituir o gabinete de Domingos de Oliveira e este apresentou efectivamente, em 24 de Junho, a sua demissão ao presidente da República. Carmona convocou de imediato uma reunião do Conselho Politico, realizada no dia 28, à qual assistiu Salazar que, segundo Franco Nogueira, dela saiu, com uma «alegria íntima mal reprimida» no rosto. Cinco dias depois, surgiu na imprensa a notícia de que Presidente da República convidara Oliveira Salazar a constituir governo. Em 5 de Julho de 1932 começava uma nova era no regime político português, com a tomada de posse de António de Oliveira Salazar como Presidente do Ministério.