Ao centro, o autor do livro, Embaixador José Manuel Duarte de Jesus, tendo à sua direita o General Garcia Leandro |
6.12.13
Lançamento de «Relatórios Confidenciais da II Repartição do EME para o CEMGFA. 5 de Novembro 1974/11 Junho 1975», do Embaixador José Manuel Duarte de Jesus, na Livraria Almedina, em Lisboa, no passado dia 3 de Dezembro.
11.11.13
Aqui Entre Nós | (15:15) 08 -11- 2013 | (com Irene Pimentel, autora do livro "Espiões em Portugal durante a II Guerra Mundial") | Rádio Renascença
Rádio Renascença (carregue no link acima para descarregar mp3) |
6.11.13
5.11.13
22.10.13
19.10.13
11.10.13
"Coragem em tempo de medo" | Aristides de Sousa Mendes | Centro de Coordenação Cultural de Viseu
Exposição "Coragem em Tempo de Medo" patente no Centro de Coordenação Cultural de Viseu Texto catálogo | Irene Pimentel |
9.10.13
Público & Diário Notícias | Novo Livro | (em breve)
(imagem retirada da net) BREVEMENTE MUITO BREVEMENTE |
19.3.13
16.3.13
20.2.13
Será que a História nos pode fornecer algo de preventivo e «anular o destino»?
ana vidigal, da serie "beija-florzinha" - Brasil 2012
A História
nunca se repete, no
sentido de uma determinada situação se apresentar exactamente da mesma forma em
épocas diferentes, no presente ou no futuro como noutros tempos passados. Os
acontecimentos estão sujeitos a várias determinações de contexto, em conjunções
diversas de factores diferentes, além de a cronologia, com os seus contextos
específicos, impedir a
repetição. Cada momento ou
acontecimento na História é singular e a
História enquanto disciplina estuda precisamente as singularidades nos seus
contextos específicos. Dito
isto, é importante o conhecimento da História. A célebre frase que diz que um
povo sem história e sem memória está condenado repetir os erros do passado (um
povo que não se lembra do passado está condenado a revivê-lo»[1],
ou a «repeti-lo», como diz Tzetan Todorov)[2],
não contradiz o que acima foi dito. Da mesma forma, aliás, um povo ou um
indivíduo que não se esquece de nada, está destinado fatalmente à repetição
incessante.
Memória e História
Ao
estabelecer uma ligação necessária entre a Memória e a História, Paul Ricoeur
considera que o estudo histórico põe em cena o trabalho da memória. Esta
representa, no entanto, um processo contraditório, pois tanto selecciona e
transforma experiências anteriores para se ajustarem a novos usos, como pratica
o esquecimento, a única forma de dar lugar ao presente. Se o esquecimento e a
míngua de memória («pas-assez»,
segundo a terminologia de Paul Ricoeur), frequente nos regimes totalitários e
autoritários, é um problema, o excesso de memória, ou o excesso de comemoração
(«trop-plein») relativamente a um
evento, também pode ser um problema, ao lembrar a repetição compulsiva,
referida por Freud, que conduz a substituir a lembrança através da qual o
presente se reconciliaria com o passado, pela passagem ao acto.
A
análise histórica refaz em laboratório essas operações ambíguas da memória[3]
e o historiador pratica não um «dever de memória», mas como prefere a este Ricoeur,
um duplo «trabalho de memória», à maneira do trabalho de luto, e de
esquecimento. História e memória só podem ser apreendidas com o esquecimento,
que reveste duas formas: a negativa, do esquecimento irreversível, que
corresponde à perda de documentos, e o esquecimento positivo, que é a própria
condição da memória e que, segundo Nietzsche, é condição da vida: «É possível viver quase sem lembranças e
viver feliz, como demonstra o animal, mas é impossível viver sem esquecer».
«Só quando tivermos aprendido a amar o
esquecimento aprenderemos a arte de viver» (Oscar Wilde). História e a memória só podem ser apreendidas com o
esquecimento.
A
História permite, ao mesmo tempo, que alguém não se lembre de tudo em
permanência, mas é «contra o esquecimento destruidor», através de um processo
de esquecimento de «reserva», que «tem a capacidade de preservar». Este tipo de
esquecimento reveste um significado positivo, na medida em que «o que foi»
prevalece sobre o que «já não é». A memória é o reconhecimento» do traço vivido
de um «real já passado» e lembrar-se é reconhecer uma anterioridade. Mas o
reconhecimento entrecruza-se com o conhecimento. A terceira fase da operação
historiográfica, a da escrita, da representação do passado necessita de traços
que façam emergir a história na memória. O corte entre memória e história toma
a forma de «escrita».
Relativamente
à memória, segundo Ricoeur, a escrita histórica tem a ambiguidade do «pharmakon», que é ao mesmo tempo remédio
e veneno: remédio porque se apresenta como um pró-memória destinado a proteger
do esquecimento, mas veneno, na medida em que se torna um factor de esquecimento
porque os que o tomam, cessam de exercer a sua memória, substituindo o trabalho
desta, pela escrita. A História estabelece uma distância com o seu objecto de
referência, mas, na medida em que é mais distante, mais objectivante, mais
impessoal na sua relação com o passado, ela pode ter um papel de equidade e de
verdade, para temperar a exclusividade e a fidelidade das memórias
particulares. Pode contribuir, segundo Ricoeur, para transformar a memória
infeliz em memória feliz, pacificada, em justa memória[4].
Lembre-se
um mito grego acerca da relação entre a História, cuja patrona é a musa Clio, e
a Memória, cuja deusa é Mnemosyne, mãe de Clio. O objectivo das musas é fazer
com que as pessoas esqueçam as suas preocupações e os seus traumas, que lhes
são incessantemente relembrados por Mnemozyne. Ora, na mitologia, um dos
objectivos da História é precisamente tratar a Memória e curar as experiências
traumáticas que esta transporta[5].
O «trabalho da História»
Enquanto conhecimento, a História é uma tomada de distância que
permite ao investigador libertar-se do passado e ter em conta as mudanças
ocorridas nas sociedades. Enquanto
a memória se apoia sobre a experiência vivida num passado que deixou marcas nos
actores, se coloca no evento e faz-se contemporânea daquele que a tenta
transmitir, enquanto a História tenta apreender o evento, distanciando-se e
extraindo dele uma substância e um sentido. A História é uma tentativa de
conhecimento e de análise, reconstrução, compreensão e de narração do passado,
perspectivado através do presente, do qual o investigador parte sempre. Ora, no
caso dos historiadores do passado recente, os perigos da interpretação do
passado à luz do presente são talvez maiores do que aqueles com que se
confrontam os historiadores do passado mais remoto. Por um lado, porque as
fronteiras entre presente e passado são mais ténues, gerando o perigo de
comparações abusivas e, por outro lado, porque o aumento da curiosidade pela
história recente tem, por vezes, intuitos ideológicos e valorativos.
O
trabalho de história é um duplo trabalho de recordação e de luto em que, ao dar
uma «sepultura» aos mortos e à morte uma materialidade, cria simultaneamente a
categoria do «ser-em-dívida», que assegura a ligação entre o futuro e o passado
e representa a relação entre as gerações. Para
Ricoeur, é na medida em que os homens do passado «estiveram lá» com os seus
projectos, os seus medos e esperanças, deixando a sua marca (impressão) no
mundo onde nascemos, que eles exercem ainda uma influência sobre a nossa existência
actual. Eles deixaram-nos valores e significados culturais, uma pré-compreensão
do mundo e do ser humano sedimentado e transmitido através das gerações. Por
isso, mantemos uma «dívida» relativamente a eles, mesmo quando nos esforçamos a
«subtrair-nos à sua influência».
É porque a história escreve as nossas dívidas para com os mortos que ela obriga
a ter em conta as promessas não cumpridas no passado. Assim, como o
reconhecimento exige o conhecimento, a dívida face ao passado é a condição de
uma relação actuante com o futuro. Dessa
forma, a representação e a escrita histórica não se limitam à análise
distanciada do passado, mas contribuem também para a história em curso e «a
história por fazer».
O
passado tem um estatuto dual porque mesmo quando as coisas passadas já não
existem - já não são -, elas nunca deixaram de existir – foram-no. O «não…mais»
do passado não pode obscurecer o objectivo historiográfico que olha para os
vivos que eles eram, antes de se tornarem os ausentes da história. Através da
representação historiográfica, os homens do passado «olham para nós». A
representação histórica «toma o lugar» do passado e revela, por um lado, que os
mortos perderam para sempre a capacidade de falar, mas que a sua causa é
defendida pelo historiador, enquanto «representante» deles, diante do tribunal
dos leitores, isto é no terreno da discussão pública actual. Dessa forma, o seu
trabalho não se limita à análise distanciada do passado, mas contribui também
para a história em curso, «a história por fazer», ao possibilitar indirectamente
aos seus contemporâneos entrar em contacto com os homens do passado. A dívida face
ao passado é a dívida das gerações presentes, fonte de ética da
responsabilidade[6].
Singularidade e comparação
A
História estuda as singularidades nos seus contextos específicos. Uma das consequências imediatas na
clivagem entre memória literal e memória exemplar (ou, entre memória e justiça)
é a impossibilidade de proclamar em simultâneo que um certo evento é absolutamente
único e que ele deve servir-nos de lição para interpretar muitas outras
situações. Se o evento é único, ele pode ser guardado na memória e agir em
função dessa lembrança, mas não pode ser utilizado como chave em nenhuma outra
ocasião. Reciprocamente, retirar de um evento passado uma lição para o presente
supõe um reconhecimento de traços comuns entre ambos. Proust dizia que não se
pode tirar nenhuma lição se se pensa sempre encontrar-se na presença de uma
experiência que não tem precedentes no passado»[7].
O
historiador Henry Rousso lembrou que a comparação tem um valor heurístico, pois
não é mais que um ponto de apoio para melhor relevar as singularidades próprias
a cada sistema. Por exemplo, apesar da singularidade do Holocausto, é útil
compará-lo com outras situações essencialmente diferentes, pois que a
comparação serve mais para «desbanalizar uma situação» do que banalizar uma
realidade extrema e pode constituir o princípio de uma construção de um
discurso alternativo da memória à qual as outras vítimas da história se poderão
agarrar. Sem minimizar nem exagerar Auschwitz, a memória desse campo de
extermínio pode, apesar da sua singularidade, ser tomada como ponto de vista
indissociavelmente cognitivo e ético sobre a História universal[8].
Escolha-se um exemplo, para se
perceber de que forma a História pode funcionar como um processo preventivo,
sem, porém, ter pretensões de profetizar ou «anular o destino»:
Há uma
tendência hoje para comparar a crise financeira, económica, social e política
actual com a crise de 1929 que provocou nos anos trinta do século XX diversas situações singulares, entre as quais se contou a
ascensão na Europa de ditaduras de carácter autoritário ou totalitário, com a
situação actual dos anos dez do século XXI. Por outro lado, após o triunfo do
Estado-providência, no pós-II Guerra Mundial, assiste-se neste momento, por
várias razões, entre as quais se conta a demografia, a uma crise desse mesmo
Estado social que pode fazer tender para soluções de tipo assistencial que se
pensava desaparecidas, no mundo ocidental. neste momento em que se fala,
a nível governamental, em «refundação» do Estado social e em que a demografia é
claramente desvantajosa, talvez seja interessante revisitar a forma como a
problemática social foi gerida durante a Ditadura de Salazar, até ao 25 de
Abril de 1974.
A era da
segurança social, universal, baseada nos direitos dos cidadãos, só nasceu em
Portugal depois do 25 de Abril de 1974, tendo o processo de construção do
Estado do Bem Estar português sido muito mais tardio e diferente do que o
moldou, noutros países europeus, o chamado «Estado Providência». E hoje, quase
40 anos depois, estaremos a assistir, em Portugal, a um daqueles recuos
históricos, que por vezes surgem, embora sempre assumindo tonalidades
diferentes? Tonalidades tão diferentes que diferenciam seguramente as duas
situações em comparação na sua essência, impossibilitando saber-se ou
profetizar-se o que virá a acontecer no futuro, devido ao processo estar
aberto. No entanto, conhecer o que aconteceu no processo fechado do passado,
através da revelação das suas matrizes, pode, mais do que indicar caminhos,
revelar aqueles pelos quais não se deseja andar.
[1]
Henry Rousso, «Pour une histoire de la mémoire collective,
l´après Vichy, Histoire politique et
sciences sociales, questions au xx siècle, Paris, éditions Complexe, 1991,
pp. 249, 251
[3]
Michel de Certeau. Les chemins de l´histoire, dir. Christian
Delacroix, François Dosse, Patrick Garcia, Michel Trebitschn, ed Complexe,
CNRS/IHTP, 2002, pp. 163-169
[4] Paul Ricoeur, La mémoire, l´Histoire, l´oubli, Paris, Ed. Seuil, 2000, apud.
François Dosse, «Le moment Ricoeur», Vingtième
Siècle, revue d´histoire, n.º 69, janvier-mars 2001, pp. 138, 139, 141,
147, 148, 150 e 152
[5] Antonis Liakos, «History writing as the return of the repressed», Historein, «A review of the past and other stories, European
Ego-histories. Historiography and the Self,
1970-2000», Athens,
volume 3, 2001, pp. 50-51, 56-57
[6] André
Breitling, « l´Ecriture de l´histoire: un acte de sépulture?» Ricoeur, dir Myriam Revault d´Allonnes
et François Azouvi, Paris, Éd. de l`Herne, 2004
[7] Tzetan Todorov, «La mémoire et ses
abus», op. cit., pp. 35, 37, 39, 41 e
44
[8] Henry
Rousso, Vichy, l´évènement, la
mémoire, l´ histoire, Paris,
Gallimard, folio histoire, 2001, pp.25, 176, 181, 184,
187, 207, 219, 223, 224, 322, p. 662, nota 1
Jornada Como responder ao momento presente? por Irene Pimentel e Maria Filomena Molder
ana vidigal, "pour l'amour de l'eternité", 2013 |
Tudo começou num encontro inesperado e feliz entre nós num intervalo da Conferência Internacional sobre Portugal e o Holocausto. Aprender com o Passado. Ensinar para o Futuro que teve lugar na Fundação Calouste Gulbenkian nos dias 29 e 30 de Outubro de 2012.
Estamos certas de que a nossa participação nessa Conferência proporcionou uma base e um incentivo para a iniciativa que recebeu como título uma pergunta – Como responder ao momento presente? – e que se viria a realizar na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da NOVA, no dia 6 de Dezembro de 2012.
Desde o início que contámos com o apoio e o interesse incondicionais do Reitor da Universidade Nova de Lisboa e do Director da FCSH. É de salientar que também desde o início o Reitor da Universidade de Lisboa correspondeu com entusiasmo ao nosso convite, e só por razões inadiáveis de calendário não esteve presente.
Não se pense, porém, que a nossa ideia fosse uma reunião oficial ou semi-oficial. De comum acordo, dispensámos as regras protocolares e cada um dos convidados se apresentou como interveniente – sediado directa ou indirectamente na Universidade ou convocado por ela –, que desejava corresponder ao que estava em causa na pergunta da Jornada.
Neste Editorial a intenção não é a de fazer um resumo da todas as contribuições (escritas ou orais; em presença ou em diferido), pois todas elas ou já fazem parte ou farão parte integrante deste blogue. Excepto quando não dispomos de texto, identificando nesse caso o autor. O que nos interessa é relevar os aspectos focados com maior insistência e, ao mesmo tempo, dar conta da variedade fértil das perspectivas, na expectativa de podermos dar uma ideia da vida própria que se engendrou naquela longa manhã de 6 de Dezembro – o período previsto, entre as 10h e as 13h, foi largamente ultrapassado, e às 14h ainda ninguém arredava pé –, a saber, uma comunidade formar-se, que aqui e agora se prova e se põe à prova.
Interveniente como ponto de partida, foi o papel da Universidade, da educação, da ciência e da cultura, no que respeita ao exercício da liberdade crítica – como seja o de desmontar a ideia feita de que não há alternativas. Conjuntamente, esse papel foi objecto de escrutínio, através da interrogação constante sobre a relação entre a Universidade e o fora dela, que se apresentou sob formas várias: desde a descrição sintomatológica das suas patologias até à evocação de uma experiência catártica em que a relação dentro/fora se dissipa e a aula é feita numa rua qualquer, passando pelas propostas terapêuticas mais latas ou por projectos à medida das necessidades e vontades, e também pela urgência de se fazer cumprir como Universidade que “pode e deve contrariar a tendência crescente para a opinião superficial e para a “tudologia” que o sistema mediático ajuda a que sejam aceites como ‘verdades’”. Mais adiante se verá como estas palavras de Emílio Rui Vilar teriam uma pedra-de-toque inesperada e lamentável. Não podemos deixar de salientar a chamada de atenção do Reitor da NOVA para a ausência em Portugal de uma cultura da confiança e para a urgência de a exercitar (no momento, acrescentamos nós, em que ela parece mais ameaçada do que nunca).
Houve quem lembrasse aquilo de que a maior parte dos presentes no Anfiteatro I da FCSH não se poderia lembrar: como era a vida antes do 25 de Abril de 1974 em termos de liberdades e direitos. O que convém não esquecer.
Houve quem tomasse a sério as palavras de Hannah Arendt, escolhidas como epígrafe da Jornada e correspondesse ao nosso apelo, desdobrando-o e particularizando-o numa série de apelos que corresponderam à apresentação de outras tantas disciplinas de responsabilidade, entre a consciência dos limites e das reais possibilidades.
Houve quem esclarecesse confusões várias sobre a temporalidade histórica e as suas aporias. A partir da relação entre história e memória, simultaneamente como luto e rememoração, foram abertas clareiras para se poder responder às perguntas: será que os acontecimentos se repetem ou será que são únicos?
Houve quem respondesse ao desafio do momento presente, uma “ficção certa”, partindo da evidência de já estarmos dentro/diante dele e se dispusesse a traçar um caminho local (ligado ao que cada um faz) de soluções viáveis, de esforços realizáveis, pondo de lado gestos grandiloquentes e ilusionistas.
Houve quem se interrogasse sobre a soberania nacional e os enxovalhos a que tem sido submetida, sem ceder às frase feitas sobre o assunto, surpreendendo-nos com um uso imaginativo e preciso do “xadrez” político, desafiando-nos a encarar o que seja um “paradigma supranacional”.
Houve quem não fugisse à pergunta sobre a responsabilidade do artista no momento presente: diante da sua obra ou diante do seu público ou mesmo diante da sociedade? A resposta desarmou qualquer receita previamente requentada.
A um dado momento já adiantado da hora, deu-se uma suspensão discursiva no Anfiteatro I, e mesmo para os que a previam, imprevisível, levada a efeito pelo grupo O pátio/c-e-m. Vimos e ouvimos uma resposta ao momento presente, através de uma oferenda dançante e teatral, que durante um tempo – não foi medido - nos fez sentir em estado de leveza e nos revigorou. Neste caso, o video da Jornada será a todos os títulos precioso.
Um aspecto a destacar prendeu-se com o espaço crítico jornalístico e editorial, no qual se integra a pedra-de-toque acima referida. Neste âmbito tivemos em primeira mão e na primeira pessoa a notícia do afastamento do jornalista António Guerreiro pelo semanário Expresso. Foram focados os seguintes aspectos: 1) a hipoteca da autonomia editorial às decisões comerciais das grandes superfícies e aos critérios jornalísticos que lhes correspondem; 2) a multiplicação de “tudólogos” nas redacções dos jornais; 3) a mistificação do “leitor médio”; 4) o crescente império da ignorância e do desprezo pela cultura; 5) a redução da esfera pública crítico-literária; 6) a expectativa de que esta autêntica catástrofe conheça uma regeneração, desde logo porque os objectivos económico-financeiros não são realizados, pois os que alimentam o estado de coisas estão ameaçados pelo pânico de um fracasso iminente. É simples, a categoria volúvel do leitor médio não assegura o êxito das vendas.
Estas palavras provocaram em todos os presentes perplexidade e consternação, mas também vontade de reagir, de protestar.*
Neste âmbito, inseriu-se um conjunto muito relevante de questões relativas à situação da investigação e do investigador nas chamadas ciências humanas, da qual Nuno Venturinha traçou o quadro minado pelos mal-entendidos editoriais da internacionalização, para o qual se contribui, recorrendo-se a fundos nacionais (FCT) ou a conhecimentos pessoais. Em todo o caso, o investigador raramente recebe alguma coisa pela sua publicação. Assim, o trabalho científico resulta num financiamento de 97% de editoras estrangeiras, nas quais é muito difícil publicar. A publicação científica tornou-se uma indústria que se estende igualmente aos artigos publicados em revistas internacionais, publicadas por grupos editoriais que depois vendem pacotes de revistas científicas às Universidades (incluindo a nossa). Aquilo que promove este sistema é a exigência de publicar nestas editoras e revistas e o facto de se valorizar mais estas publicações do que publicar em Portugal. Por outro lado, os critérios das editoras são os já apontados. Sendo que em filosofia, em literatura, em história, por exemplo, não podemos esperar ser lidos por uma multidão. A rematar foi apresentada uma proposta: a criação de uma chancela da nossa Universidade, à maneira do que acontece com outras instituições académicas.
Os primeiros textos a serem inseridos no blogue foram os únicos publicados na imprensa: o de André Freire, que seis dias depois lembrava no Público a realização de Jornada, sublinhava a sua importância e mostrava as suas consequências no quadro das relações entre Universidade e o fora dela. E o de Viriato Soromenho Marques, saído no próprio dia da Jornada na Revista Visão, o qual, respondendo ao nosso apelo, o glosou de uma forma drástica: “Que fazer neste longo naufrágio?”, apontando para o seu ponto nevrálgico: “As instituições que nos governam traíram a nossa confiança”.
Agradecimentos
(por ordem de participação presencial e não presencial)
Reitor da Universidade Nova de Lisboa
Director da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Emílio Rui Vilar
André Freire
Patrícia Vieira
António Guerreiro
Nuno Venturinha
Gustavo Rubim
Salomé Lamas
O Pátio/c-e-m
Viriato Soromenho Marques
Teresa Pizarro Beleza
Guilherme d’Oliveira Martins
António Marques
Vanessa Brito
Helena Vasconcelos
António Bracinha Vieira
Duarte Gonçalves
A muitos ainda que se manifestaram, mostrando a sua solidariedade, propondo-se colaborar, ou dando provas de iniciativas afins, como é o caso de Teresa Cadete, José Bártolo e Pedro Farinha Gomes, e os elementos do Jornal O Espelho.
E a todos os que generosamente se deslocaram ao Anfiteatro I da FCSH numa fria e chuvosa manhã e permaneceram até ao fim da Jornada, apoiando e motivando o seu desenrolar com a sua disponibilidade e atenção activa, contribuindo com as suas intervenções (lembramos algumas delas: Luís Crespo de Andrade, Maria do Carmo Vieira, José Gil, Constantino Martins, Gonçalo Marcelo, Helena Pereira de Melo), para o enriquecimento mútuo, criando o embrião de uma comunidade que esperamos se torne cada vez mais firme e vasta. Um agradecimento especial à Maria João Mayer Branco que com as suas pacientes notas nos ajudou a redigir este Editorial. E também a Ana Margarida Querido, Secretária do Departamento de Filosofia da FCSH, pelo entusiasmo e empenho que pôs na concepção do cartaz-anúncio da Jornada e na sua divulgação.
Finalmente, gostaríamos que este Editorial fosse tomado não só como um genuíno exercício de rememoração, mas também como um desafio para não desarmar, para não deixar cair o que foi iniciado. Houve quem celebrasse a iniciativa e pedisse para que ela não fosse, por assim dizer, um recibo de acto único. A criação deste blogue, e o esforço de todos quanto se empenharam directa ou indirectamente nele é já uma resposta a esse apelo
E a seguir?
Anunciamos uma segunda edição da Jornada, da iniciativa de António Marques, que terá lugar no próximo dia 27 de Fevereiro, no mesmo Anfiteatro I da FCSH, pelas 18h. Desta vez temos um tema preciso, que será desenvolvido pelo constitucionalista Jorge Reis Novais: "Constituição e direitos fundamentais em situação de emergência financeira".
Passem a palavra, não guardem as perguntas sobre direitos fundamentais em situação de emergência financeira para outro dia, convidem pessoas que possam ajudar a aprofundar o debate.
* Foi nesse mesmo momento que nasceu o propósito de escrever uma carta a enviar ao Expresso, na qual não só se dava conta da estupefacção dos subscritores pelo afastamento de António Guerreiro, como se avaliava criticamente aquilo de que isso era sintoma e se traçavam as suas consequências. Eis a lista dos signatários: Eduardo Lourenço, Fernando Belo, Gonçalo M. Tavares, Irene Pimentel, José Gil, Manuel Villaverde Cabral, Maria Filomena Molder, Maria João Mayer Branco, Teresa Pizarro Beleza e Vasco Graça Moura. O pedido de publicação ao director do Expresso caiu em saco roto. Esta nota não serve apenas para sublinhar o que está em causa nessa não-publicação – remetendo para o processo de afastamento de António Guerreiro –, fornece igualmente mais elementos para continuarmos a fazer a pergunta: “Como responder ao momento presente?” e para agirmos em conformidade
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